A
nova visão do mundo e a visão do mundo na Bíblia.
A visão do mundo, que a ciência
comunica, nos ensina que a terra é um pequeno planeta entre muitos que giram ao
redor do sol, e que existem bilhões de galáxias no universo. Calcula-se que o
universo existe há mais de 13 bilhões de anos, enquanto a Bíblia diz que ele foi
formado em seis dias. Duas visões bem diferentes, sendo assim, como evitar que a
ciência leve a Palavra de Deus ao descrédito? O que fazer para integrar a mensagem
bíblica com a realidade que a ciência nos apresenta?
A
variedade das interpretações da Bíblia
No Brasil, uma grande maioria do
povo não tem costume de leitura. Além disso, em muitos lugares, é difícil o
acesso aos meios de leitura: jornais, revistas, livrarias. Mas hoje todos ou
quase todos têm rádio, celular e televisão, e claro a internet. Aqui está um dos
maiores desafios. Há muitas opiniões sendo divulgadas pelas várias religiões
sobre a Bíblia. A TV Record, a TV Canção Nova, a TV Globo, a TV Aparecida, cada
uma tem à sua maneira de ler e de transmitir as histórias da Bíblia. Como
ajudar o povo a discernir e, assim, evitar que tudo se relativize? Quais os
critérios para ajudar as pessoas a discernir e a não se acomodar na massificação?
Como encontrar a Verdade, num mundo em que o relativismo coloca a opinião de
cada um como sendo a verdade?
O
problema do “Fundamentalismo”
Na nossa
linguagem, dizer “Fulano é um fundamentalista” não é nenhum
elogio. A palavra sugere uma forma negativa de se buscar os fundamentos da
vida. O fundamentalista se fecha na letra e não se abre para o Espírito. O apóstolo
Paulo diz: “A letra mata, o Espírito é que dá a vida” (2Cor 3.6).
De fato, a política desumana da Apartheid contra o povo negro na África do Sul
era baseada numa leitura fundamentalista da Bíblia. A destruição de grande
parte da religião e da cultura dos povos indígenas da América Latina no século
XVI estava baseada numa leitura fundamentalista do livro de Josué. O mesmo
fundamentalismo levou os cristãos a criar a inquisição que condenou muitas
pessoas à morte na fogueira. Muitas guerras, tanto no passado como no presente,
nasceram e continuam nascendo de uma leitura fundamentalista dos textos
sagrados. Hoje, diante da violência política que estamos vivendo, este
fundamentalismo é o maior desafio porque está dividindo nossas comunidades.
Estes
poucos exemplos mostram como o fundamentalismo teve e pode ter uma influência
negativa sobre a leitura que o povo faz da Bíblia. Não nego que os fundamentos
são necessários e essenciais para não se deixar levar por qualquer vento de
doutrina que apareça (veja 1Co 3.10-11; Efésios 2.20-22; 4.11-16), mas a questão
aqui é o fundamentalismo baseado numa interpretação equivocada e errônea do que
a Bíblia nos ensina?
Como, então, buscar e encontrar os fundamentos verdadeiros da vida e da fé?
Na
Estrada de Emaús, aparece o jeito de Jesus usar a Bíblia
Neste episódio de Emaús Lucas
transmite para os cristãos do primeiro século e para todos nós os três momentos
de como Jesus usava a Bíblia (Lc 24.13-35).
1º
Momento: interpretando a realidade (Lc 24.13-24): Jesus
encontra os dois amigos numa situação de medo e descrença. As forças de morte,
a cruz, tinham matado neles a esperança. Aquilo em que eles acreditavam parecia
ter sido apenas um sonho, uma expectativa que foi frustrada. Esta é a situação de muita
gente hoje. Jesus se aproxima e caminha com eles, escuta a conversa e
pergunta: "O que é que vocês andam conversando pelo caminho?" A
propaganda do governo e da religião oficial da época, impedia-os de
enxergar: "Nós esperávamos que ele fosse o libertador de Israel, MAS...".
O primeiro momento é este: aproximar-se das pessoas, escutar a
realidade, sentir os problemas; ser capaz de fazer perguntas que ajudem a
pessoa a olhar a realidade com um olhar mais crítico. Entender o momento da
história de vida de cada um na história que sendo registrada e dirigida por
Deus.
2º
Momento: interpretando a Bíblia e a história do povo (Lc 24.25-27): Jesus
usa a Bíblia para iluminar o problema que fazia sofrer os dois amigos e para
esclarecer a situação que eles estavam vivendo. Por meio da Bíblia ele situa a
Cruz dentro do conjunto do projeto de Deus, desde Moisés e os profetas. Assim,
ele mostra que a história não tinha escapado da mão de Deus. Jesus usa a Bíblia
não como um doutor que já sabe tudo, mas como o companheiro que ajuda os amigos
a lembrar o que eles tinham esquecido. Jesus não provoca complexo de
ignorância, mas desperta neles a memória. O segundo momento é
este: lembrar o que os profetas ensinaram e assim, com a ajuda da Bíblia,
situar os fatos de hoje dentro do plano de Deus e ajudar as pessoas a
transformar a cruz em sinal de vida e de esperança. Deste modo, a cruz que os
impedia de caminhar, torna-se força e luz no caminho. O sonho que parecia ter
acabado é na verdade o início de uma mudança na realidade que eles estavam vivendo.
3º
Momento: partilhando a Boas Novas na comunidade (Lc 24.28-32): A
Bíblia, ela sozinha, não abriu os olhos dos discípulos. Ela fez e faz até hoje arder
o coração. O que abriu os olhos e fez enxergar, foi a fração do pão, o
gesto comunitário da partilha, a oração em comum, a celebração da Ceia. No
momento em que eles reconhecem Jesus, Jesus desaparece. Às vezes, o povo
pergunta: “Jesus desapareceu. Foi para onde?” A melhor
resposta é esta: “Ele foi para dentro deles, pois eles mesmos
ressuscitaram”. Pois, se Jesus estava vivo, com ele devia estar um poder ainda
maior que o poder de Herodes e de Pilatos. Estes, o máximo que podem é matar.
Não tem poder para fazer ressuscitar. Este poder maior, revelado em Jesus
ressuscitado, faz os discípulos vencer o medo da morte. Eles mesmos
ressuscitam. Ressuscitados, são capazes de caminhar com seus próprios pés. O terceiro
momento é este: saber criar um ambiente de fraternidade, de celebração
e de partilha, onde possa atuar o Espírito Santo. É ele que nos faz descobrir e
experimentar a Palavra de Deus na vida e nos leva a entender o sentido das
palavras de Jesus (Jo 14.26; 16.13). É ele quem nos leva a partilhar a vida, a
verdadeira vida que nos foi dada em Jesus.
O
resultado do uso da Bíblia: Ressuscitar e voltar para Jerusalém (Lc 24.33-35): Os
dois discípulos criam coragem e voltam para Jerusalém, onde continuavam ativas
as mesmas forças de morte que tinham matado Jesus. Mas agora tudo mudou. Coragem,
em vez de medo! Retorno, em vez de fuga! Fé, em vez de descrença! Esperança, em
vez de desespero! Consciência crítica, em vez de fatalismo frente ao poder!
Liberdade, em vez de opressão! Numa palavra: vida, em vez de morte! Em vez da
má notícia da morte de Jesus, a Boa Notícia da sua Ressurreição! Imediatamente,
eles levantam e voltam para Jerusalém (Lc 24.32-35). Os dois experimentam a
vida, e vida em abundância! (Jo 10.10). Sinal do Espírito de Jesus atuando
neles! O resultado do uso da Bíblia é este: Criar coragem,
alegria e partilha. Superar o medo pela certeza de Jesus ressuscitado que está
no meio de nós. Irradiar alegria pelo reencontro com Jesus, o mesmo Jesus de
sempre que viveu com eles, morreu, ressuscitou e agora está no meio deles.
Partilhar entre nós a fé na ressurreição e, assim animar-nos mutuamente.
Os três elementos básicos do
método de Jesus revelado no caminho de Emaús: (1) A Realidade que faz sofrer e
ficar desanimado. (2) A Palavra que anima e faz arder o coração. (3) O encontro
comunitário, orante e fraterno, que abre os olhos e faz perceber Jesus presente
no meio de nós.
E este Jesus presente que nos é
revelado na Palavra que compartilhamos no domingo, deve fazer parte de nossas
vidas todos os dias, quando partilhamos a Palavra no lar, no trabalho, na
escola, onde você estiver. A Palavra de vida e vida eterna como disse Pedro
quando questionado por Jesus depois de um longo discurso em que muitos o abandonaram:
Senhor, para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna (veja Jo
6.60-69).
extraído e
adaptado de http://revista.olutador.org.br/
(Carlos Mesters e Francisco Orofino)
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